Num dos estudos que tive de fazer a
propósito de Direito Internacional Público, deparei-me com um
texto de um professor de Filosofia da Universidade de
Innsbruck chamado Hans Kochler, recentemente mais reconhecido
por considerar o julgamento de Lockerbie uma farsa e dizer que
só com o recurso é que será possível corrigir a situação.
Por o considerar extremamente interessante e por dar
uma luz diferente sobre o problema das sanções económicas como
alternativa à guerra, creio que será também do vosso agrado e
que pode mesmo gerar algumas inflexões de posição, senão,
torná-las melhor sustentadas.
Resumindo todo o
jargão jurídico, o texto resume-se nestes pontos-chave:
O Art. 41 da Carta das Nações Unidas estabelece que o
Conselho de Segurança pode determinar medidas não-militares
para fazer valer as suas decisões. Tais medidas estão
intimamente ligadas com a manutenção ou restauração da paz e
da segurança internacional, paz e segurança internacional que
são a razão de existência das decisões não-militares (de
referir que nunca no Art 41 se fala em sanções, antes em
medidas não militares).
Ou seja, só podem ser
utilizadas medidas deste tipo para que a paz e a segurança
internacional sejam mantidas ou restauradas. Alega Kochler
que, desta forma, são duplamente ignorados os direitos
humanos:
a) não são considerados os direitos humanos
como razão para a aplicação de medidas económicas
b)
não são considerados os direitos humanos como receptáculos do
impacto de tais medidas económicas de cariz sancionatório nem
a sua influência na qualidade de vida - em muitos casos, da
sobrevivência - das populações afectadas.
Desta forma,
conclui Kochler, que as Nações Unidas dão, nesta questão,
maior importância à paz e à segurança internacional que aos
Direitos Humanos.
Diz também Kochler que devem as
sanções económicas ser analisadas sob um ponto de vista ético.
Assim, as sanções económicas representam uma forma de 'punição
colectiva', indo contra o princípio ético da responsabilidade
individual.
Para Kochler, a punição colectiva de
pessoas não responsáveis pelas decisões políticas roça o
terrorismo, dado que o objectivo das sanções económicas mais
não é do que o tentar influenciar as decisões políticas de um
governo através de um assalto às populações civis. Ora,
qualquer acto de dano para com um inocente é um acto imoral
per se.
Quanto ao ponto de vista ético de quem aplica
as sanções, é normal dizer-se que o sofrimento das populações
mais não é do que um não intencional mas inevitável 'dano
colateral. Para contrariar esta ideia, Kochler, seguindo a
dicotomia de Warren Quinn, estabelece a diferença entre
'bombardeamentos terroristas' e 'bombardeamentos
estratégicos', segundo o qual os primeiros seriam aqueles em
que o sofrimento das populações civis fosse intencional e os
segundos aqueles em que o sofrimento das populações civis
fosse meramente tolerado. Ora, para Kochler, é indiscutível
que as sanções económicas se assemelham mais a
'bombardeamentos terroristas', visto serem intencionadas para
as populações civis.
Desta forma, as populações civis
são explicitamente tomadas reféns de uma estratégia de
política de poder. Diz Kochler que é para ele evidente que
esta instrumentalização política do ser humano é incompatível
com o seu estatuto de ser autónomo, com dignidade humana.
Assim, todos nós temos o direito de vetar 'toda e qualquer
tentativa de tornar o mundo um sítio melhor às nossas custas'.
Ou seja, deve ser contestada estas ideias que, no caso
das sanções, sacrificam a saúde e a prosperidade de todo um
povo em favor das considerações políticas externas de Estados
membros do Conselho de Segurança ou de uma coligação de
Estados (tal raciocínio pode ser feito para várias situações
onde houve aplicação deste tipo de sanções como a ex
Jugoslávia, Iraque, Haiti, etc.)
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